SISTEMATIZAÇÃO DE LEITURA: A SOCIOLOGIA DE GEORG SIMMEL






RESUMO: Para Simmel a sociedade é produto das interações sociais, o autor faz uma reflexão nos textos acima sobre o que é a sociedade, sobre o que é o indivíduo e sobre a questão do conflito na sociedade. O conflito para Simmel é algo positivo pois para ele é um momento em que há o desenvolvimento da tomada de consciência individual, que teria uma função positiva para sociedade como um todo, principalmente à medida que o conflito fosse superado, mediante acordos. Para Simmel um conflito só pode ser resolvido primeiramente caso haja a exposição do problema causador e consequentemente que na resolução deste conflito nenhuma das partes envolvidas sintam-se prejudicadas.
Discorrendo sobre o que seria a sociedade Simmel mostra que

“A partir de um outro ponto de vista,totalmente diferenteadmite-se que a existência humana só se realiza nos indivíduos, sem que toda via com isso se reduza a validade do conceito de sociedade.Entendido em seu sentido mais amplo, o conceito de sociedade significa a interação psíquica entre os indivíduos [...]”(pág. 15)

“A sociedade não é, sobretudo,uma substância, algo que seja concreto para si mesmo. Ela é um acontecer que tem por função pela qual cada um recebe de ourem ou comunica a outrem um destino e uma forma”(pág.18)

E sobre o conflito:

“Tão logo a vida avança além da mera animalidade em direção ao plano do espirito, e o espirito, por sua vez, ao plano da cultura, manifesta-se nela uma oposição interna cujos desenvolvimento, resolução e ressurgência constituem todo o caminho da cultura.” (p. 119).

“(...) esses produtos dos processos vitais têm a peculiaridade de já possuir, no momento em que surgem, uma existência fixa própria, que nada mais tem a ver com o rtmo inquieto da vida mesma, sua ascensão e seu declínio, sua renovação contínua, suas incessantes cisões e reunificações.” (p. 119). “Em velocidade mais rápida ou mais lentya, as forcas da vida corroem cada conformação cultural que emerge (...)” (p. 120).

“A mudança das formas culturais aparece como o objeto da historia em seu sentido mais forte.” (p. 120).

“A contínua mudança dos conteúdos culturais e, enfim, de estilos culturais inteiros é o símbolo – ou melhor, o resultado – da fecundidade infinita da vida, mas também da profunda contradição na qual seu eterno devir e modificação se opõe à validade autoafirmação objetivas de suas manifestações e formas, junto às quais ou nas quais a vida vive.” (p. 120).

“As forcas econômicas de cada época geram uma forma de produção que lhes é adequada.” (p. 120).

“É a vida mesma – aqui em sua ramificação econômica –, com sua urgência e seu querer ultrapassar, seu autotransformar e diferenciar, que fornece dinamismo a todo o movimento; mas, sendo em si informe, ela só pode se manifestar como algo já formado.” (p. 121).

“Não se chegou, assim, à miséria cultural que conhecemos e que os mais velhos entre nós vimos crescer de modo progressivo, até o ponto em que uma forma nova absolutamente não luta mais contra uma antiga, mas a vida se resolve em todos os âmbitos possíveis conta ter de transcorrer em formas rígidas, quaisquer que sejam.” (p. 122).

 “(...) na interpretação filosófica do mundo, já há décadas o conceito de vida começou a se tornar dominante.” (p. 122).

“(...) é notável que o significado incipiente do conceito de vida enquanto visão de mundo se comprove por antecipação no fato de os maiores antagonistas aos segmentos modernos de valor, Schopenhauer e Niettzsche, convergirem justamente com o respeito a esse significado.” (p. 124).

 “O conceito de vida é o ponto de intersecção das duas linhas de pensamento contrarias que forneceram o quadro para as decisões fundamentais da vida moderna.” (p. 125). “Das ambições divergentes cuja totalidade é designada como futurismo, apenas a verdade caracterizada como expressionismo parece destacar-se com uma unidade e clareza em certa medida identificáveis.” (p. 126).

 “A comoção não deve se prolongar ou se verter numa forma que lhe seja imposta por uma existência exterior, real ou ideal.” (p. 127).

“(...) a visão de um violino ou de um rosto humano desencadeia afetos no pintor que, transmutados por suas energias artísticas, liberam por fim uma imagem de aparência completamente diferente.” (p. 128).

“(...) o grande artista é tão puramente ele mesmo que sua obra mostra, na forma, apenas aquilo que o fluxo de sua vida engendrou por si: a forma perdeu seu direito próprio em relação à vida.” (p. 129).

“Pode-se argumentar que na arte se articula algo que vive para além da forma (disponível no seu estado consumado) da arte.” (p. 129).

“A busca por originalidade em tantos jovens do presente é, com frequência, embora de modo algum exclusivamente, uma vaidade e a tentativa de causar sensação para si mesmo e para os outros.” (p. 131).

Ainda sobre o Conflito em A natureza sociológica do conflito Simmel afirma:

“Em principio, a importância sociológica do conflito (Kampf) nunca foi questionada. Admite-se que o conflito produza ou modifique grupos de interesse, uniões, organizações.” (p. 122).


 “E de fato, os fatores de dissociação – ódio, inveja, necessidade, desejo – são as causas do conflito; este irrompe devido a essas causas. O conflito está assim destinado a resolver dualismos divergentes (...)” (p. 122).

“O fato de almejar a paz é só uma das expressões – e especialmente óbvia – de sua natureza: a síntese de elementos que trabalham juntos, tanto um contra o outro, quanto uma para o outro.” (p. 123).
“Todas as formas sociais aparecem sob nova luz quando vistos pelo ângulo do caráter sociologicamente positivo do conflito.” (p. 123)
. “Parece que antigamente havia só duas questões subjetivas compatíveis com a ciência do homem: a unidade do individuo e a unidade formada pelos indivíduos, a sociedade; uma terceira parecia logicamente excluída.” (p. 123).
 “É o conflito um fato sui generis e sua inclusão sob o conceito de unidade teria sido tão arbitrária quanto inútil, uma vez que o conflito significa a negação da unidade.” (p. 123).

 “O indivíduo não alcança a unidade de sua personalidade exclusivamente através de harmonização exaustiva – segundo normas logicas, objetivas, religiosas, ou ética – dos conteúdos de sua personalidade.” (p. 123- 124).

 “(...) a sociedade, tal como a conhecemos, é o resultado de ambas as categorias de interação, que se manifestam desse modo inteiramente positivas.” (p. 124).

“Designamos por “unidade” o consenso e a concordância dos indivíduos que interagem, em contraposição a suas discordâncias, separações e desarmonias. Mas também chamamos de “unidade” a síntese total do grupo de pessoas, de energias e de formas, isto é, a totalidade suprema daquele grupo, uma totalidade que abrange tanto as relações estritamente unitárias quanto as relações duais.” (p. 125).

 “Desde que a discordância mostra seu caráter negativo e destrutivo entre indivíduos particulares, concluímos ingenuamente que deve ter o mesmo efeito no grupo todo.” (p. 125).
O conflito como forca integradora do grupo.
“Existem aqui, entre os casos mais complexos, dois tipos opostos. Em primeiro lugar, temos os grupos pequenos que, assim como o casal, envolvem, não obstante, um número ilimitado de relações vitais entre seus membros.” (p. 126).

“Em segundo lugar, o papel positivo e integrador do antagonismo aparece nas estruturas que se distinguem pela nitidez e pela pureza cuidadosamente preservada de suas divisões e gradações sociais.” (p. 126).

“As hostilidades não só preservam os limites, no interior do grupo, do desaparecimento gradual, como são muitas vezes conscientemente cultivadas, para garantir condições de sobrevivência.” (p. 126).

“A oposição de um membro do grupo a um companheiro, por exemplo, não é um fator social puramente negativo, quanto mais vezes tal oposição pode tornar a vida ao menos possível com as pessoas realmente insuportáveis.” (p. 127).

“Nossa oposição nos faz sentir que não somos completamente vítimas das circunstâncias.” (p. 127). “Toda a organização interna de interação urbana se baseia numa hierarquia extremamente complexa de simpatias, indiferenças e aversões, do tipo mais efêmero ao mais duradouro.” (p. 128).

“(...) a antipatia é a fase preliminar do antagonismo concreto que engendra as distancias e as aversões, sem quais não poderíamos, em absoluto, realizar a vida urbana.” (p. 128). Homogeneidade e heterogeneidade nas relações sociais. “A essência da alma humana não permite que um indivíduo se ligue a outro por um elo apenas, ainda que a analise cientifica não se dê por satisfeita enquanto não determina o especifico poder de coesão de unidades elementares.” (p. 128).

“A distancia que caracteriza a relação entre dois indivíduos associados, por exemplo, pode nos parecer como o resultado de um afeto – que deveria tornar muito maior a proximidade entre eles – e de uma repulsão – que deve leva-los a ficar completamente separados (...)” (p. 129). “Muitas vezes interpretamos a quantidade de superioridade e sugestão existentes entre duas pessoas como sendo produzida pela força de uma delas, que é, ao mesmo tempo, diminuída por uma certa fraqueza.” (p. 130).

 “As relações subjetivas ou pessoais se desenvolvem, frequentemente, de maneira inversa, porque é no inicio dos períodos culturais nos quais costuma ser relativamente grande o poder de decidir por amizades ou inimizade.” (p. 131).

O antagonismo como um elemento da sociação.

 “Ao considerar os fenômenos sociológicos, encontramos assim uma hierarquia de relações. Essa hierarquia também pode ser construída a partir do ponto de vista das categorias éticas, apesar destas não constituírem, em geral, pontos de partida de muito adequados para o isolamento completo e conveniente de elementos sociológicos.” (p. 132)

 “Divergência e harmonia entrelaçaram-se inextricavelmente, e o conteúdo de animosidade evoluiu na verdade para germe de uma futura comunhão.” (p. 133).

“O desejo de possuir ou subjugar ou mesmo de aniquilar o inimigo, pode ser satisfeito por meio de outras combinações e eventos além da luta.” (p. 134).



Ao longo do terceiro capítulo de Questões Fundamentais de Sociologia, Simmel retoma os questionamentos acerca do objeto da sociologia, apresentando-nos o conceito de sociabilidade. Para ele, a sociedade parte da interação entre os indivíduos e comporta uma distinção entre forma e conteúdo. Nesta concepção, os indivíduos tendo diversas motivações (paixões, desejos etc), conteúdos da vida social, interagem a partir delas e se transformam em uma unidade. Esses conteúdos isolados não são sociais: a sociação apenas começa a existir quando os indivíduos interagem adotando formas de cooperação e colaboração, de modo que quanto mais interação existe no mesmo grupo, ele se torna mais sociedade. A sociação é a forma pela qual os indivíduos formam uma unidade para satisfazerem seus interesses, sendo forma e conteúdo, na experiência concreta, elementos inseparáveis. Sobre o conceito de forma, conteúdo, sociação e sociabilidade Simmel afirma:

“O movimento decisivo se estabelece por intermédio de dois conceitos: é possível diferenciar em cada sociedade, forma e conteúdo a própria sociedade, em geral, significa a interação entre indivíduos.” (pág. 59).

“Defino assim, simultaneamente, como conteúdo e matéria da sociação, tudo o que existe nos indivíduos e nos lugares concretos de toda realidade histórica como impulso, interesse, finalidade, tendência, condicionamento psíquico e movimento nos indivíduos (...)” (pág. 60).

 “A sociação é, portanto, a forma (que se realiza de inúmeras maneiras distintas) na qual os indivíduos, em razão de seus interesses – sensoriais, ideias, momentâneos, duradouro, conscientes, inconscientes, movidos pela causalidade ou teleologicamente determinados (...)” (pág. 60).
A sociabilidade como forma autônoma ou forma lúdica da sociação.

“O que é automaticamente “social” nessa existência é aquele ser com, para e contra com os quais os conteúdos ou interesses materiais experimentam uma forma ou um fomento por meio de impulsos ou finalidades.” (p. 64). “(...)

“o “impulso de sociabilidade”, em sua pura efetividade, se desvencilha das realidades da vida social e do mero processo de sociação como valor e como felicidade, e constitui assim o que chamamos de “sociabilidade” [Geselligkeit] em sentido rigoroso.” (p. 64).

“Não é por mero acidente do uso da linguagem o fato de que a sociabilidade, mesmo a mais primitiva, quando assume qualquer sentido e consistência, dê grande valor à forma, à “forma correta”.” (p. 64). “A sociabilidade se poupa dos atritos por meio de uma relação meramente formal.” (p. 65).

“(...) defino então a sociabilidade como a forma lúdica de sociação, e – mutatis mutandis – algo cuja concretude determinada se comporta da mesma maneira como a obra de arte se relaciona com a realidade.” (p. 65).

 “Quando os interesses reais, em cooperação ou colisão, determinam a forma social, eles mesmos já cuidam para que o indivíduo não apresente sua especificidade e singularidade de modo tão ilimitado e autônomo.” (p. 66).

“Na sociabilidade não entram o que as personalidades possuem em termos de significações objetivas, significações que têm seu centro fora do círculo de ação (...)” (p. 67).

“O ser humano como um todo é, por assim dizer, um complexo ainda informe de conteúdos, formas e possibilidades.” (p. 67).

 “Pode-se também falar de onda de sociabilidade superior e inferior para os indivíduos.” (p. 68).


Referências Bibliográficas


SIMMEL, Georg. Sociologia, A natureza sociológica do conflito. São Paulo: Ática, 1983.

SIMMEL, Georg. O conflito da cultura moderna. São Paulo: Senac, 2013.

SIMMEL, Georg. Questões fundamentais da sociologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar editor Ltda, 2006.

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