Da Divisão do Trabalho Social Émile Durkheim ( Resumo e Fichamento)
Título
da Obra: Da Divisão do Trabalho Social
Autor: Émile
Durkheim
Editor:
Martins Fontes
Tradução:
Eduardo Brandão
Lugar:
São Paulo
Data:
1999
Seção
do livro: Livro I: Capítulo I e II; Livro III: Capítulo
I, II, III e Conclusão.
Resumo: Nos trechos que
estudamos desta obra em nossa disciplina, refletimos sobre o reflexo do direito
consuetudinário e da consciência coletiva na constituição da materialidade do
crime e do sistema de justiça. Refletimos também sobre o caráter moral presente
na divisão do trabalho social, nas relações de solidariedade em diferentes
segmentos da sociedade, e o caráter moral da constituição da criminalidade. A relação entre consciência coletiva e crime.
Outra questão fundamental que tivemos a oportunidade de nos deparar no texto, é
a visão do autor de que o conflito não pode ser erradicado da sociedade porém o autor sugere uma sociedade harmônica.
Fichamento:
Livro
I – A Função da Divisão do Trabalho
Capítulo
I: Método Para Determinar Essa Função
A palavra função e empregada
de duas maneiras bastante diferentes. Ora designa um sistema de movimentos
vitais, fazendo-se abstração das suas consequências, ora exprime a relação de
correspondência que existe entre esses movimentos e algumas necessidades do organismo.
Assim, fala-se da função de digestão, de respiração, etc.; mas também se diz
que a digestão tem por função presidir a incorporação no organismo das
substancias líquidas ou sólidas destinadas a reparar suas perdas; que a
respiração tem por função introduzir nos tecidos do animal os gases necessários
a manutenção da vida, etc. E nessa segunda acepção que entendemos a palavra.
Perguntar-se qual e a função da divisão do trabalho e, portanto, procurar a que
necessidade ela corresponde; quando tivermos resolvido essa questão, poderemos
ver se essa necessidade e da mesma natureza que aquelas a que correspondem outras
regras de conduta cujo caráter moral não é discutido. (pág. 13)
Ao contrario, a palavra papel
ou função tem a grande vantagem de implicar essa ideia, mas sem nada prejulgar
quanta a questão de saber como essa correspondência se estabeleceu, se ela
resulta de uma adaptação intencional e preconcebida ou de um ajuste a
posteriori. Ora, o que nos importa é saber se ela existe e em que consiste não
se foi pressentida de antemão, nem mesmo se foi sentida ulteriormente. (pág.14)
Por aumentar ao mesmo tempo a
força produtiva e a habilidade do trabalhador, ela e condição necessária do
desenvolvimento intelectual e material das sociedades; é a fonte da civilização.
Por outro lado, como se presta de bom grado a civilização um valor absoluto,
sequer se pensa em procurar outra função para a divisão do trabalho. (pág.14)
Para solucionar a questão, não
se pode referir a analises de conceitos, que são necessariamente subjetivas;
seria necessário, isso sim, conhecer um fato capaz de servir para medir o nível
da moralidade média e observar em seguida como ele varia, à medida que a civilização
progride. Infelizmente, falta-nos essa unidade de medida, mas possuímos uma
para a imoralidade coletiva. De fato, o número médio de suicídios, dos crimes
de toda sorte, pode servir para assinalar a altura da imoralidade numa sociedade
dada. Ora, se fizermos essa experiência, ela não será favorável a civilização,
pois o número desses fenômenos mórbidos parece crescer à medida que as artes,
as ciências e a indústria progridem. (pág.15)
É nos grandes centros
industriais que os crimes e os suicídios são mais numerosos; em todo caso, e
evidente que ela não apresenta os sinais exteriores pelos quais se reconhecem
os fatos morais. (pág.15)
Sem dúvida, a atividade
industrial tem sua razão de ser, ela corresponde a necessidades, mas essas
necessidades não são morais. (pág.16)
Ao contrario, a moral e o mínimo
indispensável, o estritamente necessário, o pão cotidiano sem o qual as
sociedades não podem viver. (pág.16)
Enquanto a moral nos obriga a
seguir um caminho determinado em direção a um objetivo definido - e quem diz
obrigação diz, com isso, coerção. (pág.16)
Portanto, se não
correspondesse a outras necessidades alem destas, a divisão do trabalho não
teria outra função além da de atenuar os efeitos que ela mesma produz, de
pensar os ferimentos que faz. (pág.19)
Somos levados, assim, a
considerar a divisão do trabalho sob um novo aspecto. Nesse caso, de fato, os
serviços econômicos que ela pode prestar são pouca coisa em comparação com o efeito moral que ela produz, e sua
verdadeira função é criar entre duas ou várias pessoas um sentimento de
solidariedade. Como quer que esse resultado seja obtido, é ela que suscita
essas sociedades de amigos, e ela as marca com seu cunho. ( pág.21)
Em todos esses exemplos, o
mais notável efeito da divisão do trabalho não é aumentar o rendimento das funções
divididas, mas toma-Ias solidárias. Seu papel, em todos esses casos, não é
simplesmente embelezar ou melhorar sociedades existentes, mas tomar possíveis
sociedades que, sem elas, não existiriam. (pág. 27)
É uma verdade evidente, pois a
divisão do trabalho e muito desenvolvida nelas e produz a solidariedade. Mas e
preciso determinar, sobretudo, em que medida a solidariedade que ela produz
contribui para a integração geral da sociedade, pois somente então saberemos
ate que ponto essa solidariedade e necessária, se é um fator essencial da coesão
social, ou então, ao contrario, se nada mais e que uma condição acessória e
secundária. (pág.30)
A solidariedade social, porém,
é um fenômeno totalmente moral, que, por si, não se presta a observação exata,
nem, sobretudo, a medida. (pág. 31)
De fato, a vida social, onde
quer que exista de maneira duradoura, tende inevitavelmente a tomar uma forma
definida e a se organizar, e o direito nada mais é que essa mesma organização
no que ela tem de mais estável e de mais preciso. A vida geral da sociedade não
pode se estender num ponto sem que a vida jurídica nele se estenda ao mesmo
tempo e na mesma proporção. Portanto, podemos estar certos de encontrar
refletidas no direito todas as variedades essenciais da solidariedade social. (pág.
31 e 32)
Normalmente, os costumes não
se opõem ao direito, mas, ao contrário, são sua base. Às vezes acontece, é
verdade, que, sobre essa base, nada se eleva. Pode haver relações sociais que não
comportam mais que essa regulamentação difusa originaria dos costumes; mas e
porque carecem de importância e de continuidade, salvo, e claro, os casos
anormais que acabamos de mencionar. Portanto, se pode haver tipos de
solidariedade social que tão-somente os costumes manifestam, esses tipos são
bastante secundários; ao contrario, o direito reproduz todos os que são
essenciais, e são eles os únicos que precisamos conhecer.(pág. 33)
Nosso método já esta traçado,
pois. Uma vez que o direito reproduz as formas principais da solidariedade
social, só nos resta classificar as diferentes espécies de direito para
descobrirmos, em seguida, quais são as diferentes espécies de solidariedade social
que correspondem a elas. É provável, desde já, que haja uma que simbolize essa
solidariedade especial, de que a divisão do trabalho e a causa. Feito isso,
para medir a importância desta ultima, bastara comparar a quantidade de regras jurídicas
que a exprimem com o volume total do direito. (pág.35)
Livro
I
Capítulo
II: Solidariedade Mecânica ou por Similitudes
O vínculo de solidariedade
social a que corresponde o direito repressivo e aquele cuja ruptura constitui o
crime. Chamamos por esse nome todo ato que, num grau qualquer, determina contra
seu autor essa reação característica a que chamamos pena. Procurar qual é esse
vínculo e, portanto, perguntar-se qual a causa da pena, ou, mais claramente, em
que consiste essencialmente o crime. (pág.39)
Por mais diferentes que possam
parecer a primeira vista os atos assim qualificados, e impossível não terem
algum fundo comum. Porque, em toda parte, eles afetam da mesma maneira a consciência
moral das nações e produzem a mesma consequência. São todos crimes, isto é,
atos reprimidos por castigos definidos. (pág.40)
Portanto, se quisermos saber em
que consiste essencialmente o crime, será necessário por em evidencia as características
que se revelam idênticas em todas as variedades criminol6gicas dos diferentes
tipos sociais. (pág.40)
há uma multidão de atos que
foram e ainda são considerados criminosos sem que, por si mesmos sejam
prejudiciais a sociedade. Em que medida o fato de tocar um objeto tabu, um
animal ou um homem impuro ou consagrado, de deixar apagar-se o fogo sagrado, de
comer certas carnes, de não imolar no túmulo dos parentes o sacrifício tradicional, de não pronunciar
exatamente a fórmula ritual, de não celebrar certas festas, etc. pôde um dia
constituir um perigo social? (pág.41)
Embora o ato criminoso seja
certamente prejudicial a sociedade, nem por isso o grau de nocividade que ele
apresenta e regularmente proporcional a intensidade da repressão que recebe. No
direito penal dos povos mais civilizados, o assassinato e universalmente
considerado o maior dos crimes. No entanto, uma crise econômica, uma jogada na
Bolsa, até mesmo uma falência podem desorganizar o corpo social de maneira
muito mais grave do que um homicídio isolado. Sem duvida, o assassinato é
sempre um mal, mas nada prova que seja o mal maior. o que é um homem a menos na
sociedade? (pág. 41 e 42)
De fato, a única característica
comum a todos os crimes e que eles consistem - salvo algumas exceções
aparentes, que serão examinadas mais abaixo - em atos universalmente reprovados
pelos membros de cada sociedade. Muitos se perguntam hoje se essa reprovação é racional
e se não seria mais sensato considerar o crime apenas uma doença ou um erro. (pág.
43)
O direito penal ao contrário,
só edita sanções, mas nada diz das obrigações a que elas se referem. Ele não
manda respeitar a vida alheia, mas condenar a morte o assassino. Ele não diz em
primeiro lugar, como faz o direito civil, "eis o dever” mas de imediato:
"eis a pena". Sem dúvida, se a ação é punida, é por ser contrária a
uma regra obrigatória; mas essa regra não é expressamente formulada. Só pode
haver um motivo para isso: o de que a regra e conhecida e aceita por todos.
Quando um direito consuetudinário passa ao estado de direito escrito e se
codifica, é porque questões litigiosas reclamam uma solução mais definida;se o
costume continuasse a funcionar silenciosamente sem provocar discussão nem dificuldades não
haveria motivo para ele se transformar (pág.45)
o conjunto das crenças e dos
sentimentos comuns à média dos membros de uma mesma sociedade forma um sistema
determinado que tem vida própria; podemos chamá-Io de consciência coletiva ou
comum. Sem dúvida, ela não tem por substrato um órgão único; ela é, par
definição, difusa em toda a extensão da sociedade, mas tem, ainda assim, características
específicas que fazem dela uma realidade distinta. De fato, ela é independente
das condições particulares em que os indivíduos se encontram: eles passam, ela
permanece. É a mesma no Norte e no SuI, nas grandes e nas pequenas cidades, nas
diferentes profissões. Do mesmo modo, ela não muda a cada geração, mas liga
umas as outras as gerações sucessivas. Ela é, pois, bem diferente das consciências
particulares, conquanto só seja realizada nos indivíduos. Ela é o tipo psíquico
da sociedade, tipo que tem suas propriedades, suas condições de existência, seu
modo de desenvolvimento, do mesmo modo que os tipos individuais, muito embora
de outra maneira. (pág.50)
Portanto, resumindo a análise
que precede, podemos dizer que um ato é criminoso quando ofende os estados
fortes e definidos da consciência coletiva. (pág.51)
Em outras palavras, não se
deve dizer que um ato ofenda a consciência comum por ser criminoso, mas que é
criminoso porque ofende a consciência comum. Não o reprovamos por ser um crime,
mas é um crime porque o reprovamos. (pág. 52)
Portanto, é sempre a essa última
que convém tornar. É dela que, direta ou indiretamente, decorre toda
criminalidade. O crime não é apenas a lesão de interesses, inclusive consideráveis,
é uma ofensa a uma autoridade de certa forma transcendente. Ora,
experimentalmente, não há força moral superior ao indivíduo, salvo a força
coletiva. Existe, por sinal, uma maneira de verificar o resultado a que
acabamos de chegar. o que caracteriza o crime é o fato de ele determinar a
pena. Portanto, se nossa definição do crime for exata, ela deverá explicar
todas as características da pena. (pág.56)
Mas hoje, dizem, a natureza da
pena mudou; não é mais para se vingar que a sociedade pune, é para se defender.
A dor que ela inflige não e mais, em suas mãos, senão um instrumento metódico
de proteção. Ela pune, não porque o castigo lhe oferece, por si mesmo, alguma
satisfação, mas para que o temor da pena paralise as más vontades malignas. Não
e mais a cólera, mas a previdência refletida que determina a repressão. (pág.57)
Portanto, a pena permaneceu,
para nós, o que era para nossos pais: ainda e um ato de vingança, já que e uma
expiação. O que vingamos, o que o criminoso expia, é o ultraje a moral. (pág.60)
Assim, a natureza da pena não
mudou essencialmente. Tudo o que se pode dizer é que a necessidade de vingança
esta mais bem dirigida hoje do que ontem.(pág.61)
A pena não serve, ou só serve
de maneira muito secundária, para corrigir o culpado ou intimidar seus possíveis
imitadores; desse duplo ponto de vista, sua eficácia é justamente duvidosa e,
em todo caso, medíocre. Sua verdadeira função é manter intacta a coesão social,
mantendo toda a vitalidade da consciência comum. Negada de maneira tão categórica,
esta perderia necessariamente parte de sua energia, se uma reação emocional da comunidade
não viesse compensar essa perda, e dai resultaria um relaxamento da
solidariedade social. (pág. 81e 82)
Numa palavra, para se ter uma
ideia exata da pena, é preciso reconciliar as duas teorias contrárias que foram
oferecidas para ela: a que vê nela uma expiação e a que faz dela uma arma de
defesa social. Com efeito, é certo que a pena tem como função proteger a
sociedade, mas isso porque é expiatória; e, por outro lado, se ela deve ser
expiatória, não é porque, em consequência de não sei que virtude mística, a dor
redima a falta, mas porque a pena só pode produzir seu efeito socialmente útil
sob essa necessária condição. (pág.83)
Livro III- As Formas
Anormais
Capítulo I: A
Divisão do Trabalho Anômica
Capítulo II: A
Divisão do Trabalho Forçada
Capítulo III:
Outra Forma Anormal
Conclusão
Conquanto, normalmente, a divisão
do trabalho produza a solidariedade social, algumas vezes, porém, ela apresenta
resultados totalmente diferentes, até mesmo opostos. Ora, é importante
pesquisar o que a faz desviar assim da sua direção natural; porque, enquanto não
estiver estabelecido que esses casos são excepcionais, poder-se-ia suspeitar
que a divisão do trabalho os implicasse logicamente. Por sinal, o estudo das
formas desviadas permitir-nos-á determinar melhor as condições de existência do
estado normal. Quando conhecermos as circunstâncias em que a divisão do
trabalho deixa de engendrar a solidariedade, saberemos melhor o que é necessário
para que ela produza todo o seu efeito. A patologia, neste como em outros
casos,é um precioso auxiliar da fisiologia. (pág.367)
Poderíamos ser tentados a
situar entre as formas irregulares da divisão do trabalho a profissão do
criminoso e as outras profissões nocivas. Elas são a negação mesma da
solidariedade e, no entanto, são verdadeiras atividades especiais. Contudo,
para sermos exatos, não se trata nesse caso de divisão do trabalho, e sim de
diferenciação pura. (pág.368)
Ao mesmo tempo que a
especialização se torna maior, as revoltas se tornam mais frequentes. "A
menor causa de descontentamento bastava para pronunciar interdito contra uma
casa, e ai do operário que não respeitasse a decisão da comunidade." É bem
sabido que, desde então, a guerra tornou-se mais violenta. (pág.370)
Basta lembrar, onde quer que
seja necessário, "o espírito de conjunto e o sentimento da solidariedade
comum", e tal ação, só o governo esta qualificado para exercer. É verdade,
mas ela é demasiado geral para assegurar o concurso das funções sociais, se
este não se realizar por si mesmo. (pág. 376)
À medida que as diferenças se tornam mais
numerosas, a coesão se torna mais instável e precisa ser consolidada por outros
meios. Imaginem a multiplicidade crescente das ciências especiais, com seus teoremas
suas leis, seus axiomas, suas conjeturas, seus procedimentos e seus métodos, e
compreenderão que uma fórmula curta e simples, como a lei da evolução, por
exemplo, não pode· bastar para integrar uma complexidade tão prodigiosa de fenômenos.
(pág. 380)
A filosofia existe como a ciência
coletiva da ciência e, neste caso como nos demais, o papel da consciência
coletiva diminui à medida que o trabalho se divide. (pág.380)
Mas não é necessário, nem
mesmo possível, que a vida social seja sem lutas. o papel da solidariedade não
e suprimir a concorrência, mas sim moderá-Ia.(pág. 382)
Esses diversos exemplos são,
pois, variedades de uma mesma espécie; em todos os casos, se a divisão do
trabalho não produz a solidariedade, e porque as relações entre os órgãos não são
regulamentadas, e porque elas estão num estado de anomia.(pág.385)
A divisão do trabalho supõe
que o trabalhador, longe de permanecer debruçado sobre sua tarefa, não perca de
vista seus colaboradores, aja sobre eles e sofra sua ação. Ele não é, pois, uma
maquina que repete movimentos cuja direção não percebe, mas sabe que tendem a
algum lugar, a uma finalidade que ele concebe mais ou menos distintamente. Ele
sente servir a algo. Para tanto, não é necessário que abarque vastas proporções
do horizonte social, mas basta que perceba o suficiente dele para compreender
que suas ações têm uma finalidade fora de si mesmas. Assim, por mais especial,
par mais uniforme que possa ser sua atividade, ela será a atividade de um ser
inteligente, pois terá um sentido, e ele o sabe. Os economistas não teriam
deixado na sombra essa característica essencial da divisão do trabalho e, em consequência,
não a teriam exposto a essa critica desmerecida, se não a tivessem reduzido a não
ser mais que um meio de aumentar o rendimento das forças sociais, se tivessem
visto que ela e, antes de mais nada, uma fonte de solidariedade.(pág.390)
A única causa que determina,
então, a maneira como o trabalho se divide é a diversidade das capacidades.
Pela força das coisas, a divisão se dá, pois, no sentido das aptidões, pois não
há razão para que ela se produza de outra maneira. Realiza-se assim, por si
mesma, a harmonia entre a constituição de cada individuo e sua condição.
Dir-se-á que nem sempre e o bastante para contentar os homens; que há homens
cujos desejos sempre superam suas faculdades. E verdade; mas são casos excepcionais
e, podemos dizer mórbidos. Normalmente, o homem fica feliz ao consumar sua
natureza; suas necessidades se acham proporcionadas a seus meios. Assim, no organismo,
cada órgão só reclama uma quantidade de alimentos proporcional a sua dignidade.
A divisão do trabalho forçada e, pois, o segundo tipo mórbido que reconhecemos.
Mas é preciso não se enganar sobre o sentido dessa palavra. o que faz a coerção
não e qualquer espécie de regulamentação, pois, ao contrario, como acabamos de
ver, a divisão do trabalho não pode dispensar uma regulamentação. (pág. 394)
Inversamente, podemos dizer,
portanto, que a divisão do trabalho só produz a solidariedade se for espontânea
e na medida em que for espontânea . Mas, por espontaneidade, deve-se entender a
ausência, não apenas de qualquer violência expressa e formal, mas de tudo o que
pode tolher, mesmo indiretamente, a livre expansão da força social que cada um
traz em si. A espontaneidade supõe não apenas que os indivíduos não sejam
relegados a força a funções determinadas, mas também que nenhum obstáculo, de
qualquer natureza, os impeça de ocupar, no âmbito social, a posição
proporcional a suas faculdades. Numa palavra, o trabalho só se divide
espontaneamente se a sociedade for constituída de maneira que as desigualdades
sociais exprimam exatamente as desigualdades naturais. Ora, para tanto, e necessário
e basta que estas últimas não sejam nem realçadas, nem depreciadas por alguma
causa externa. Portanto, a espontaneidade perfeita nada mais e que uma consequência
e uma outra forma deste outro fato: a absoluta igualdade nas condições
exteriores da luta.(pág.395)
E verdade que essa
espontaneidade perfeita não e encontrada em parte alguma como fato realizado. Não
ha sociedade em que ela seja pura. Se a instituição das castas corresponde a
repartição natural das capacidades, isso só se da de uma maneira aproximada e, em suma,
grosseira.(pág. 396)
Do mesmo modo que o ideal das
sociedades inferiores era criar ou manter a vida comum mais intensa possível,
em que o individuo viesse se absorver, o nosso é colocar cada vez mais equidade
em nossas relações sociais, a fim de garantir o livre desenvolvimento de todas
as forças socialmente úteis. (pág.407)
Os deveres do individuo para
consigo mesmo são, na realidade, deveres para com a sociedade. (pág.421)
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